aqui trila ainda a cigarra o seu violino
como nas pinturas infantis
na história com a formiga
quando o calor se liberta da terra e o vento
silva o trigo e a cevada abrasadas
pela luz poente
as horas de rotação trazem-te
o lusco-fusco que se alumia
de pirilampos renascidos
aos anos de silêncio em jarros
talvez haja ainda esperança
para o homem que perdeu a sua meninez
à primeira notícia da existência da morte
sentado na cozinha para o lanche de manteiga
e pão e os pés balançando sobre o abismo
desse chão que só num salto em queda se chegava
o mensageiro foi o primo que te acompanhou
no soluçar de um choro descoroçoado
dias antes a família pasmava na indecisão do insecto
no candeeiro de betão se ter metamorfoseado
iludindo a ave predadora
mostrando-se bicéfalo
ou se duas borboletas se entregavam
ao instinto da permanência
era a vida afinal
não desistindo que se deu a reconhecer
quando o cartão de visita do hospital
das forças-a(r)madas as apartou
por breves momentos tão tão breves
quanto
os espaços entre soçobros
nesse diálogo na cozinha de benfica
e hoje o mesmo espanto que te incendiava
o rosto e o estômago
arde num sorriso
na noite acesa
a fósforo enquanto lágrimas
te dão a beber a memória
o único álcool para os teus lábios
Sem comentários:
Enviar um comentário