terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Per Aage Brandt - 5 poemas

o resultado disto é uma mão pousada no teu rosto sorridente,
um dedo na tua boca e uma voz à distância dos continentes
e um cabelo deixado nos lençóis, coisas que são
como seres humanos, mas mais do que isso,
talvez um grão de poeira, uma partícula numa golfada de ar,
o pensamento de uma hora passada na companhia de um morto
estendido sobre um banco numa segunda-feira à tarde,
a sociedade ausente,
tal como ela surge a um estafeta de bicicleta
com uma mensagem para o Pilar da Liberdade em CPH; ou um gato numa árvore

*

confesso que pequei, andei de bicicleta de boca aberta
por causa de uma alegria momentânea, enquanto o dia
declinava, através da alameda de palmeiras, e uma mosca veio
ao meu encontro e entrou-me na boca, então cuspi-a sem pensar
não era o unico ciclista na alameda

*

os meus grandes lábios entumescem e isso
não pode ser, nunca por nunca, o sentido da vida

*

há três pontos de vista no mundo:
o de um ser humano o de um narrador e
o de sirius que é o único que sabe tudo
enquanto o narrador sabe um pouco
de tudo e o ser humano o
suficiente sobre como é
amar alguém até ao ponto de o próprio tempo
suspender a respiração ou choramingar e rasgar
o céu e a terra até que eles se confundam
e tudo isto sendo o que é talvez o
                                                   (fim)

*

uma sombra sem peso desliza por uma parede,
nada a pode parar, como ninguém pode
impedir um nome ou um canto ou uma ausência
ou um contorno ou o teu rosto de existir


(nota - CPH é a abreviatura de Copenhaga utilizada no código postal)


in Per Aage Brandt, Livro da noite, Lisboa, Quetzal, col. poetas em Mateus, 2004: 19, 20, 21, 23, 24.

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