quarta-feira, 16 de setembro de 2009

ponte





em quantas madrugadas, arrefecidas pelo repouso ondulante,
vimos a noite erguida nos teus braços.
aqui as ondas entram no crepúsculo sobre a cota reluzente;
funde o vento ao ritmo das ondas
as algas gelatinosas que se arrastam pela costa, – talvez
o teu desígnio – ainda uma praia para além do desejo!

insistente durante o sono, uma maré de vozes
– serenamente agora, antes do dia reclamar os nossos olhos
que se agitavam, dia após dia, debaixo do monte
ou é o nosso sorriso sabático e inconsciente
de ficar sem fôlego – a teu gosto… eh?

agarrando-se à infância como um jogo sem fim
(oh! noites que me levaram até ao seu corpo despido!)
que és tu, perdido no interior deste encanto sem marés?
nenhum abraço se entreabre a não ser o pungente mar,
e flancos e olhos nupciais que escondiam um orgulho dourado.
até que imortal sangrasse na madrugada.
e vi-te mergulhar para beijar aquele destino
e fizemos as nossas juras nas cercas desertas de cobalto…
mas nós – demasiado tarde ou demasiado cedo, não importa…
regressámos pelo longo trilho! escolhido na sombra
(serás um vagabundo até ao fim?)
com os olhos carregado de erva verde
rocha ameaçadora – verde – que ressoa – que afoga
e selvagens filhas do mar
(a última viagem foi uma tragédia) – onde estás
de novo caindo no silêncio, enquanto o tempo limpa
e temos o riso, ou mais lágrimas inesperadas.
novas realidades, novas ideias vagas no murmúrio aveludado
detectives terrestres do vento em patrulha de madrugada.

as estrelas raiaram os nossos olhos com antigas certezas
e isto, a tua outra mão, sobre o meu peito
sempre capaz de tudo dar até ao fim dos meus últimos dias.
nem agora ou repentinamente, – não deixes nunca que
qualquer apelo – cai inútil entre as ondas.
toda a noite a água alinhou os teus cabelos com negras
pérolas fustigam-lhe as ancas, uma chuva de fios em turbilhão.

oh chuva às sete
que confunde Março com os céus Antárcticos de Agosto
ao pôr-do-sol com uma paciência silenciosa de teias de aranha…
que revelam um novo destino a reencontrar…
passarás os dedos pelos joelhos – e desejarás estar na cama
e assim
calma

e um pouco mais vazio que antes
aqui na orla da água os ponteiros deixam cair a memória;
lançam uma resposta como se todos os barcos do mar
como saudações, despedidas – nas alturas dos planetas cintilantes
tantos casais numa única crisálida, –
murmúrios como antífonas oscilam no azul celeste


A partir de A Ponte de Hart Crane
2009

2 comentários:

M disse...

uau...digo eu que sou limitada nas palavras mas não nos sentidos

fernando machado silva disse...

não sei se devo agradecer, uma vez que sou tanto ou mais limitado, já que me aproveito das palavras e dos livros dos outros (coisa que fazemos há milénios)