terça-feira, 18 de agosto de 2009

uma branda vida





para a marta

triste num comboio de madrugada
deixaram-me só
um eco claro das coisas que viste
lá fora, ao vento? – sonho mais um pouco
o sol nasce sobre o último suor
e vai para longe
no coração há quase um grito
olho o céu e as nuvens e lá em baixo
rostos ensonados andam pelas ruas
e é como se o vento os dispersasse. mas disperso
no brando rumor da vida
que no meu coração está
está a lua sobre o mundo
afasta-se, regressa. a luz
a sombra quente entre as casas. o cheiro
palavras de amor. em ti
as proezas solares de ontem
o sol de setembro, ou talvez um muito leve
um tanto triste ao meu ardor
mas, entre elas, vede com que graça
agora um louro sol sobre a negra oficina
quarto. nos teus olhos há papoilas vermelhas
de carne, personagem anónima
passa a ser dócil olhar, amor calmo
e calmo estremecia, já longe
à sua porta, ou quereria entrar de noite
depois de te ter explicado muitas vezes,
chove no meu sono, chove sobre o rio
parecia escutar de novo o seu segredo.

devo estar a ficar velho, se fiz uma longa viagem
amava tudo no mundo. e tinha apenas
luzes de cemitério, dedos calmos
sentia a praça já vazia
de madrugada, estava cheia de um desejo meu
o coração de sinais sem nome
este meu passo cansado, que não quer
e é diferente
distante como o sol e tão próximo
a terna companhia
talvez a tua lenta melancolia se dissipe
na natureza. uma flor chama outra
na noite húmida o rio em silêncio.

percorri toda a cidade
quando o inverno começa nas mãos
e até a chuva era minha aliada
e a minha estrela é aquela estrela baça
os teus calmos espectáculos. a vida.
noite. a beleza passou de bicicleta
separou-nos de repente esta manhã
que eu não vejo.
volta um pensamento de amor
é este poema! e tu
fecha uma janela e olha para a cama
amor, juventude, ledas palavras
e de mim fala o mundo: árido bem
feito de palavras delicadas
e leves e aveludadas de verão
parece o meu coração
amor de coisas belas.
deito-me na manhã

foi assim que passaste no seu rosto?
é todo ele tecido com profundas harmonias
de um remorso demasiado antigo

constantemente se abrem e fecham
(ela dormia respirando lentamente
a minha vida
e já não se afasta
lentíssima)
domina toda a minha vida
mas estou ausente: e sonho com o cemitério
não será o amor um laço estreito
eu da vida tão enamorado
e amanhã cairá também a tua flor
quanta melancolia na vida serena
e no entanto, esta vida
o que há é o hálito de qualquer coisa que virá
como o tédio de um dolce far niente
eu sombrio, no banco, e vazio
feliz estrangeiro em todos os lugares
a beleza dos que não sabem
imóvel e perdido, lentamente
o viajante sem sono

o um era do outro. de um só
embora já não me lembre de quem sou.

2008
A partir de No brando rumor da vida de Sandro Penna

1 comentário:

Marta disse...

muito obrigada!