1) O corpo é
material. É denso. É impenetrável. Se o penetramos, separamo-lo,
esburacamo-lo, rompemo-lo.
2) O corpo é
material. Encontra-se fora. Distinto dos outros corpos. Um corpo
começa e acaba contra um outro corpo. Mesmo o vazio é uma espécie
muito subtil de corpo.
3) Um corpo não
está vazio. É pleno de outros corpos, de bocados, de órgãos, de
peças, de tecidos, de rótulas, de anéis, de tubos, de alavancas e
de foles. É igualmente pleno de si mesmo: é tudo o que ele é.
4) Um corpo é
longo, largo, alto e profundo: tudo isso em grande ou pequena medida.
Um corpo é superfície. Ele toca de cada lado noutros corpos. Um
corpo é corpulento, mesmo quando é magro.
5) Um corpo é
imaterial. É um desenho, um contorno, uma ideia.
6) A alma é a
forma de um corpo organizado, diz Aristóteles. Mas o corpo é
precisamente aquilo que desenha a forma. Ele é a forma da forma, a
forma da alma.
7) A alma
espalha-se através do corpo, diz Descartes, ela está completamente
espalhada ao longo dele, precisamente nele, insinuada nele, metida,
impregnante, tentacular, insuflante, modelante, omnipresente.
8) A alma é
material, de toda uma outra matéria, uma matéria que nem tem lugar,
nem tamanho, nem peso. Mas ela é material, muito subtilmente. Também
ela escapa à vista.
9) O corpo é
visível, a alma não é. Percebe-se bem que um paralítico não pode
mover a sua perna de bom modo. Não se percebe que um mau homem não
possa mover a sua alma de bom modo: mas devemos pensar que é um
efeito de uma paralisia da alma. E que é preciso lutar contra ela e
fazê-la obedecer. Eis o fundamento da ética, meu caro Nicómaco.
Jean-Luc Nancy in Corpus. Paris, Métailié, col. Sciences humaines, édition revue et
complétée 2006 (2000).
2 comentários:
Excelentes textos.
Muito obrigado pela tradução.
Xico
obrigado eu pela visita.
abraço.
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