quinta-feira, 16 de junho de 2011

Carta de Amor





Não é fácil enunciar a mudança que proporcionaste.
Se agora estou viva, antes estava morta,
Embora, como uma pedra, tranquila por isso,
Quieta de acordo com o hábito.
Não me moveste somente uma polegada, não –
Nem me deixaste a apontar com o meu glabro olho
De novo o céu, sem esperança, claro,
De apreender todo o azul, ou estrelas.

Não foi isso. Dormi, digamos: uma disfarçada
Serpente entre negras rochas como uma negra rocha
No níveo hiato de neves –
Como os meus vizinhos, retirando nenhum prazer
Entre os milhões de bochechas perfeitamente
Cinzeladas iluminando cada momento a fim de derreter
As minhas bochechas de basalto. Transformaram-se em lágrimas,
Anjos chorando sobre estúpidas naturezas,
Mas não me convenceram. Essas lágrimas congelaram.
Cada falecida face fruiu uma viseira de gelo.

E continuei dormindo como um dedo dobrado.
A primeira coisa que vi foi ar puro
E as encerradas gotas crescendo em orvalho
Límpidas como espíritos. Muitas pedras jaziam
Densas e inexpressivas ao redor.
Não sabia o que fazer delas.
Brilhei, de mica escamada, e desdobrei-me
Para me jorrar como um fluido
Entre patas de pássaros e os caules de plantas.
Não fui enganada. Percebi-te logo à primeira vista.

Árvore e pedra reluziam, sem sombras.
O comprimento dos meus dedos cresceu luminoso como vidro.
Comecei a florescer como um ramo de Março:
Um braço e uma perna, um braço, uma perna.
De pedra a nuvem, assim ascendi.
Agora pareço uma espécie de deus
Flutuando através do ar nos meus saltos de alma
Pura como um painel de gelo. É um dom.

in Sylvia Plath, Crossing the water - transitional poems

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