quinta-feira, 10 de março de 2011

arkaneftá (8)

“lá fora, alguém chama por si próprio, perdido no frio e na chuva, alguém procura”. ela acorda de um pesadelo e abraça o amante, que acorda sobressaltado onde a mão dela já lhe tocava, limpando as lágrimas que caíam no rosto do amante - eu estou aqui, não estás só - e ela encontra uma emoção nova, de uma concha que a envolve, lambendo, sofregamente, o sal na sombra escura que lhe velava os olhos - por uma ideia de esperança e de amor, onde a desgraça não atingirá nenhum deles, apenas atravessando a morte, até um ou ao outro. em pensamento estarão sempre intocáveis, pois no lugar do silêncio, no poema que todos os poetas têm que criar (esse poema maior, que todos têm que contribuir), nasce definitivamente aqui, dentro de mim, e com estes dois amantes.

(neste trabalho, neste esboroar de sonhos e pensamentos, de encontro à noite, é que exercito, na totalidade, a ciência do pensamento. quando entro neste jogo imoral, votado já desde a primeira palavra ao anonimato. é um esforço quase hercúleo este, escrever quando não sei falar, tentar esgotar-me numa novidade de pura falência, de criar uma corrente onde o pensamento ganhe uma forma desconhecida, de ritual e luta, da qual acabo sempre por sair derrotado, por nada ser realmente novo.
é no fim, talvez, que sentirei qualquer vitória amarga, que secamente desejarei queimar (embora nunca o farei, porque estas palavras falam no mutismo do papel, aquilo que nunca direi), por me sentir demasiado pesado, do ardor, da angústia, por não ter acrescentado nada na pedra sinistra e fria, por ter escrito estas palavras da raiz sombria do egocentrismo:
- eu
eu
eu
oh nem do espírito que me falta, se existisse, nem de um homem que foi assassinado, se adormecesse, nem de nada, deveria ser acordado, senão pelo poema que sairá dos ossos e se inscreverá na pele para sempre).

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