para os amantes tudo estava no sítio certo onde não estava. e essa sensação de deslocamento pesava-lhes tanto que uma vez pensaram: que se o corpo permitisse o corpo e o ar nos preenchesse como o deserto, a ver se dele irrompia a resposta desse onde inominável, essa besta oculta entre as marés junto às praias de corais, esse/essa qualquer coisa que se esconde dentro de nós, porque se se acredita mais em histórias de carpinteiros e seres com nomes indizíveis, que se revelam em livros antigos e nos reversos das palavras ou num ladrar de cão, pois também os animais se questionam sobre o que mantém o homem homem e não animal; então somos a vítima da nossa vítima.
e ao refluir esse pensamento nas suas bocas douradas, entraram de rompante os homens que não permitem o vício do amor refulgir no mundo. para os prender e para os matar. o medo, nesse momento, tornou-se tão real, como um buraco dentro de um buraco, no ouro dentro do ouro. violaram todo o espaço que eles, os amantes, tentaram sacralizar largando pequenos sinais e marcas, como os animais deixam nos seus territórios. estas marcas, estes sinais, tão obsoletos como uma palavra num vale repleto de margaridas e dentes-de-leão, como uma partícula de pó, mas que alteram toda uma ordem, todo um sistema; dissipavam tudo, eram uma grande mancha dissoluta no caos, destruindo os conceitos de território e ordem humana.
os homens agiram como tal, nada poderiam os amantes esperar deles. queimaram os livros dos filósofos e poetas, os pensamentos que os dois escarafunchavam no papel de ócio e de ódio (sim, também os amantes odeiam), porque cada coisa é a metáfora de cada coisa.
os dois observavam aquela festa, sem saber que mais viria ainda, pois a metáfora final eram os seus pobres e eróticos corpos, encostados na parede, olhando-se pelo canto do olho, a sentirem o frio da parede e o calor que lhes resvalava pelo corpo, pelos poros a inundarem-se de suor, de medo e reagindo à chama que ensombrecia os rostos dos homens tornando-os...angélicos.
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