era imperdoável que não vissem a luz
a natureza tão justamente esquecida: o
tempo distante em que tudo era novo
nesse triste fluir a que se chama memória,
erros que sobre si deixam dobrar.
esse mundo de sombras a que também pertenço
vejo a parede branca da extensa casa,
preguiçosa imagem do segredo: porque
además, los animales irracionales afirman
as suas próprias canções
sem nenhum porquê, sem hora de razão, assim
emudecem a íntima traição
para dizer, somente, um último, um primeiro adeus.
viu tudo o que tinha feito até então:
e demorou-se com sombras no diário
demasiado pobre para
triunfo, nem uma pena nem uma penugem
me contara nada de nada, tudo estava dito, quando se
era tão novo
eu sou um bom ouvinte
mas com todos os meus bens perdidos
fui-me através dos campos
outros não
de um poeta para outro e
suspendem a ilusão da vida
nas casas acendem-se luzes. a obscuridade e
vê como ele se move na distância das janelas, nome
rosto
luz de nenhum outro mundo
quase uma rocha que desaparece
sombra que sustenta uma luz vazia
estreito charco do amor
verão
rosto: mais do que o espelho
carregado de humildade, amargura, fadiga
e vem o outono e vem o inverno. e
do lado do inverno
o nevoeiro arrefece
de natureza secreta
asa turvada de oiro que perturba os lábios
fome
sentado como quem ouve e já não escuta a
pátria
um corpo escuro
o teu deserto: esta noite,
esta noite não, velhas chamas são os fósforos
uma das coisas de que mais gosto no mundo dos vivos
cabelos do destino
ontem
a água
um fio de água, límpido, profundo
o teu corpo dentro do outro corpo
a luz da sua morte. eu sei
as penas, o depenado amor, carta após carta
ninguém se despede e todos seguem por caminhos
estou a explicar isto tudo muito mal. o deus músico
palavras. mas
quem receia escrever o findar do dia
a uma chama: as marcas do fogo, a coluna do fogo a fonte
este homem existiu, existe ainda. não lhe queria
um negro cabelo - de que perdido amante?
e não sei porque me disse ao ouvido aquela
sou eu sempre quem o vê
ouvi uma das noites deste outono
sem parar
viviam no mesmo apartamento ao ...
havia um frasco de comprimidos, tomou-os. sobre a cama esperou
mas hoje os seus nomes estão de mãos vazias.
esse homem, quem quer que fosse, vi-o
ele era a negra sombra que tanto se parece ao solitário
frágil voz,
ferrugem que maculou a juventude de sangue
e dos lábios saídos da infância
transparece a vida
de nenhuma fadiga, fome, sede
um nome sobre outro nome
um modo nítido e fugidio
sem sequer uma imagem apagada que se tenha refugiado
ainda estou vivo, apesar de enterrado
olhos não muito inteligentes, mas sensíveis, como convém
em luz, em tonalidade múltipla pelo fim da hora da
pele sobre a mais profunda água. as palavras são
relíquias tecnológicas; desenha sobre o desenho.
o incompreensível canto ficou por decifrar "não tenhas medo
espera, como se estivesse sentado, em solidão errante, entre
um charco de água afundada. voa, rápido
acesa ao favor do vento
não longe, uma velha cama de ferro
as lâminas do mar.
a partir de Não é certo este dizer de João Miguel Fernandes Jorge
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