quinta-feira, 15 de abril de 2010

uma canção da jukebox




não pude estar lá, confesso.
sinto-me agora ultrapassado
- tudo, enfim, falece -
túmulo de pureza, ou surda festa de enganos.
de ter ganho tudo aquilo que perdi
que devagar fomos perdendo

mas eram estas as veias
aquele sorriso enforcado
depois, e só por difícil acaso
uma certa violência
o rosto, o corpo que não foi nosso,
assim, e amante regular
a música que se afasta do teu corpo:
quando o desastre chega
ainda há quem chame a isso «juventude».

esta noite, porém, trocava a minha vida
com a exacta representaçaõ do mal
que confundi com o amor - e onde
nunca me pareceu tão tristes
os passos tidos que não demos
para o horror de estarmos vivos

enfim, sorrir. mas as lágrimas, de
óculos de escuro contorno,
de chamarmos alma ao que não existe
demolido rosto que quiseste tanto
tão urgente e impronunciável
que consiga prolongar a noite
sujando uma alegria que até na dor
- como eu diria se escrevesse fados
- nos perseguirá outra vez a vida inteira

não comprei bilhete
por estes dias sobre a terra
a morte sabe onde fica

make it rain, disse ele

foi disso que não falámos toda a noite:
há um ano, no tempo em que estávamos vivos.

a partir de Jukebox 1 e 2 de Manuel de Freitas

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