terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Galway Kinnell - O trilho por entre as pedras (cont.)


3

Saí de mim,
por entre as pedras do campo,
cada uma enviando a sua frescura-fantasma
às luzes das estrelas, para flutuar
por sobre as árvores, à procura de me unir
aos fogos sobrenaturais ascendendo e morrendo

no espaço – e recuando, sabendo
da tristeza do desejo
para descer
de volta ao brilho de um chão magoado,
as pedras amparando entre pasto e campo
o imenso núcleo de granito,
cintilando, mesmo elas, de antigos pressentimentos de loucura e guerra.


4

Um caminho abre-se
a meus pés. Desço
a passo de mula à luz da noite para a terra,
as pegadas atrás de mim
enchendo-se já de trilhos pré-sacrificiais
de canários, desço
para o aterro irrespirável
de tudo que alguma vez almejei e perdi.

Um velho, uma lamparina
de pedra na sua testa, de cócoras
junto às suas chamas infernais, agita
a sua caçarola
de cabeça de corvo
decepada, fios de luz branca,
cauda aberta de pavão, corpo
vestido de canário, peito de pisco
arrastado pelos enlameados campos de batalha, torcido
botão de flor caput mortuum – tudo
salga com areia
roubada das campânulas de cima de ampulhetas...

Nada.
Sempre nada. Sangue ordinário
a ferver no brilho da lamparina da testa.


in Galway Kinnell, The Book of Nightmares, Boston & New York, Houghton Mifflin, 1971: 58-59.

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