domingo, 7 de outubro de 2018

palavras de um estilita antes de partir

cansei-me de levar        como a luz
de um farol os barcos pelas fragas e
rotas do naufrágio          o meu nome
aos teus lábios       visto-me
de castanho e verde         deixo este sol
secar os meus caracóis
enfrentando os raios
da manhã depois de entrar no mar

com cautela apanho umas quantas folhas
anónimas rubras e ainda frescas
relíquias desdenhadas
e numa praça onde um dia passarás
aí estou de braços ao alto e corpo torcido

russel edson disse que corri
para casa e entrando de rompante
como só os mensageiros o sabiam
fazer antes da sua morte
disse a meus pais ser uma árvore
enquanto eles só viram o outono da minha desilusão
na sua miopia imaginativa

dirão        talvez         foi um estilita
rir-se-ão de mim como outrora
riram dos acrobatas da vida
tão em fama hoje
entre os desolados e fatigados
do moderno e pós

quando um dia o que me deram
de nome         enfim         cruzar a tua memória
ou como destroço dar à tua boca
estarei ainda na praça entre animal e planta
imperceptível         ver-me-ás tanto
quanto a destruição
já lambendo os teus pés
e tarde
demais            como todas as desculpas

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