quinta-feira, 5 de abril de 2018

As horas para um poema - 7 (fim)

7
descansa agora
do que vives
eu escrevo


(NOTA: a estrutura do poema e a sua dobra, o livro do Génesis, surgiu-me, sem saber bem que ligação ocorreu no meu cérebro despoletando a sua escrita, quando assistia, com a minha companheira, ao filme "Three billboards outside Ebbing Missouri". A «matéria» deste poema trata, justamente, da matéria de um poema, a matéria bruta - afectos e perceptos - que encontram uma formalização na linguagem - no sentido de tomarem uma forma linguística - sem terem, necessariamente, um sentido específico determinado. Por outras palavras, à medida que o poema vai sendo escrito há um sentido que vai surgindo simultaneamente, o sentido é produzido com a produção do poema e não lhe está pré-determinado; ele é, o mais das vezes, uma nebulosa pressentida que se vai materializando com a ligação constelar de pontos vibráteis, nervosos e a matéria bruta envolvida por essa nebulosa refina-se. Assim, eu, enquanto vou experienciando a vida, sou escrito por afectos e perceptos que se mantém desconectados até que, atraídos por tensões potenciais, chocam, conectam-se e do caosmos da minha vida - corpo e mente e não só corpo, ou só mente - forçam a sua criação, a sua escrita, o seu génesis, a sua génese; mas quem escreve é já outro «eu» e quem, ainda depois, reescreve e cinzela, risca e corta, é ainda outro, daí o uso da segunda pessoa do singular no poema e, agora, o uso da primeira pessoa para falar do poema e do sujeito do poema. Isto não é uma teoria do poema e da poesia senão do meu processo.)

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