quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Galway Kinnell - Flor de galinha



1
Esparramado
nos nossos rostos nas noites de
primavera, os dentes
mordendo em penas de galinha, pedaços de galinha
ainda presas nas fissuras – se ao menos
pudéssemos nos soltar
como ela, lançar-mo-nos
à mercê das trevas, como a galinha,

esconder a cabeça
sob uma asa, quedar-mo-nos
por uns momentos, como ela
cai no seu pequeno transe entre o joio,
ou virar-mo-nos
e sermos afagados com um dedo
nas penas da garganta,
nas articulações da garganta,
ao longo do sussurro
da fúrcula afinando o seu ré alto em sangue fino,
ao longo do peito levantado
pela carne do peito, até que a coisa gorda
desfalece, cabeça
lançada para trás
na tábua de cortar, ansiando apenas
que morra.


2
Quando a brisa
perfumada de machado se agita
sobre ela, bochechas esmagadas,
a sua crista
acinzenta, a moela
que roda as milhares de mós acidíferas do seu destino
convulsiona: pronta ou não
o último ovo, pespontando
o seu globo de terra dourada,
derrapa para fora, livrando-a
mesmo da vida por vir.


in Galway Kinnell, The Book of Nightmares, Boston & New York, Houghton Miffli Company, 1971: 11-12.

Sem comentários: