quarta-feira, 20 de novembro de 2013

uma edificação da queda em sesimbra

nada predizia esse momento
da perfeita queda por entre os ramos
do pinheiro justo ao teu ombro desnudado
de uma luminosidade sobre a tua carne dourada
salgando-se de suor. hoje posso dizer
o amor tem o seu lugar específico
a sua distinta morada no mundo:
o teu ombro e o teu selvagem cabelo
em infantis brincadeiras com o meu desejo

a tua respiração passava pelos meus dedos
e o teu coração batia sobre os meus lábios
espumosas vagas enovelavam-se na fraga deste corpo
o mês de julho e seus amenos dias declinava
nessa triste e desabitada casa em que nos íamos conhecendo

perdoem-nos amigos e família
a paixão é egoísta uma pobre eremita
pouco nos interessava a crise à beira destas poucas vidas
tínhamos fronteiras suficientes
(passado cultura línguas)
dobradas à força de uma certa clandestinidade
reconhecida somente por aqueles que nada mais têm a perder
que o amor trágico que sempre nasce perdido

mas fechem os livros esqueçam as histórias
e considerem aqueles dois corpos
(eu e tu meu amor eu e tu
e tudo que nos aparta
e nas partidas nos traz de volta)
num sentimental verão mareado
tendo à mão o luxo do tempo
o ócio juvenil sentados numa espreguiçadeira

ele (eu) de tronco nu recostado no encosto
ela (tu) pouco mais vestida e reclinada sobre ele
a sua mão masturbando-a
ambos ébrios de desejo e vinho
até o cansaço os levar à bátega morna do sono
(a eternidade dos segundos a sua duração)
muito pouco teve o amor para construir um mundo
sobre a ruína dessas duas vidas
mas soube edificar um abismo de luz sobre o teu ombro


para a minha desamparada e continuada queda.

2 comentários:

Maria Eu disse...

Maravilhosa história da consumação de um amor clandestino.

fernando machado silva disse...

obrigado