quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

W. G. Sebald




Autor: W. G. Sebald
Título: O caminhante solitário
Editora: Teorema
Tradução: Telma Costa

               Disse um dos meus bisavôs – não sei se o será, mas é uma piada de família pela partilha do apelido e ter parentes para lá da raia – num verso que correu mundo, que o caminho se faz caminhando. Sim, por entre a terra ainda por desbravar, onde nenhum trilho há, o passo marca o caminho que só o é repetindo-o, uma e outra vez. Porém, fazemo-lo sempre sozinhos, solitariamente. Caminhamos a par de outros, lado a lado, mas cada caminho será o rasto do peso da nossa vida, de cada uma; e esse será o segredo de todos os caminhos: uma vida e uma morte que se farão nossos como os caminhos. Caminhando as vidas tocam-se, comungam passos, pensamentos, afectos, podemos até pisar as pegadas do outro, mas não será nunca o mesmo caminho. Parece-nos ser isso que se lê nesta bela obra de W. G. Sebald, “O caminhante solitário”.
               Escritor alemão, nascido a 1942, morre tragicamente em 2001, Norwich, no curso de uma viagem com a sua filha, que lhe sobreviveu. Tendo sido professor universitário de literatura e fundado o British Centre for Literary Translation, o seu nome foi sendo conhecido pela sua interessante – no mínimo – escrita, onde conflui ensaio com ficção, facto com imaginação, numa linguagem sóbria e límpida, mas, porém, num estilo quase tortuoso, com extensos parágrafos, em que ideias se sobrepõem a ideias. Não posso apresentá-lo melhor e mais extensamente, uma vez que esta obra foi a primeira que li do autor.
               Aqui, Sebald persegue as pisadas de autores afectivamente próximos a si. Podemos, talvez, dizer que ao longo do livro se cruzam vários caminhos, que Sebald percorre, traçados sobre dois maiores: um, toda a paisagem pré-alpina, próxima do autor quando jovem, entre a Alemanha e a Suíça; outro, o da história cultural, literária, europeia, bem como o de cada criador chamado à presença na obra, todos eles, ou suíços, ou alemães, tendo vivido e percorrido essa fria, rochosa, campestre paisagem. Dividindo o livro em seis partes, Sebald discorre sobre Keller, Hebel, Mörike, Rousseau, Walser – todos eles escritores como Sebald – e o pintor, seu amigo, Jan Peter Tripp, analisando as suas vidas, os seus tempos. Por momentos até cria encontrar-me a ler Stefan Zweig, pelo menos esse brilhante tríptico biográfico, “A combate com o demónio”, sobre Hölderlin, Kleist e Nietzsche.
               Solitário, Sebald repete os caminhos da vida dos escritores e do pintor, tão solitários quanto o próprio autor pelo seu caminho. Relata os seus passeio pela paisagem enquanto divaga entre as suas memórias e a memória que a história arquivou; traça novos trilhos, ata e desata nós, encruzilhadas do sentido das obras dos seus antepassados – no fundo, pressentimos que são invulgares retratos de família; isto porque o escritor alemão insere ao longo da obra fotografias, imagens, reproduções fac-símiles de textos dos autores e seus, que mais do que ilustrar ou aprofundar o contexto, lançam pontes que nos intimam a criar os mesmos laços que o autor estreitou pelo seu amor à literatura – de tal modo que já não são estes personagens da História, mas da sua vida, das suas ficções reais, mais ainda que da História. Serão agora também da minha, junto a Sebald.

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